O absurdo pedido de cassação da Jovem Pan
O pedido do Ministério Público Federal (MPF) para cassar as concessões de rádio da Jovem Pan é um grave atentado à liberdade de imprensa e um mau presságio para a democracia brasileira. Acusar uma emissora de “abusos graves” apenas por ter dado espaço a críticas às instituições e ao processo eleitoral é inverter completamente a lógica constitucional: o livre debate é fundamento da democracia, não sua ameaça.
Segundo o MPF, a Jovem Pan teria promovido “desinformação sistemática” e desempenhado papel central na “campanha de desacreditar as instituições nacionais” em 2022. Em suas alegações finais, o órgão chegou a pedir não apenas a cassação das outorgas da emissora, mas também multa milionária e a imposição de conteúdos obrigatórios sobre a confiabilidade das urnas eletrônicas. Trata-se de um entendimento que confunde opinião jornalística com atentado institucional e crítica editorial com crime de Estado.
É importante lembrar que os programas citados na ação – como Os Pingos nos Is e 3 em 1 – são formados essencialmente por jornalistas e comentaristas opinando sobre fatos políticos. Questionamentos sobre transparência eleitoral, ainda que contundentes, não podem ser equiparados a incitação golpista. O próprio fato de o MPF classificar manifestações críticas como “desinformação” mostra o quanto o conceito foi expandido até a arbitrariedade.
A democracia pressupõe liberdade de expressão e imprensa justamente para que a pluralidade de opiniões, inclusive as mais incômodas, possam ser ouvidas. Historicamente, desde a luta pelas liberdades no século XVIII, a liberdade de crítica a temas políticos foi uma dimensão fundamental da própria liberdade de expressão. Simplesmente não é possível haver liberdade de expressão – ou de imprensa – sem a liberdade para criticar ou opinar sobre temas políticos ou institucionais. Causa perplexidade que um órgão como o MPF pareça desconhecer isso ao querer criminalizar as opiniões e críticas políticas veiculadas pela Jovem Pan.
Quando um órgão estatal busca disciplinar o conteúdo editorial de um veículo, o que está em jogo não é a defesa da ordem democrática, mas o desejo de controlar a narrativa pública. Nenhuma democracia sobrevive quando a crítica é silenciada. Se prosperar, o pedido contra a Jovem Pan abrirá um precedente devastador. Qualquer veículo que se oponha ao establishment ou abra espaço para críticas a instituições, governo ou políticas públicas poderá ser acusado de “colocar em risco a democracia”. Sob esse manto, a censura se torna política de Estado, e a imprensa livre se converte em mera extensão da comunicação oficial dos governos e tribunais.
A história recente mostra que a imprensa muitas vezes é a única voz a denunciar arbitrariedades e desmandos. Submeter esse papel vital a censura prévia ou punição posterior equivale a fragilizar o próprio sistema de freios e contrapesos. O pluralismo – não a unanimidade – é a verdadeira garantia da estabilidade institucional.
O episódio também revela o caráter exemplar que se pretende dar à punição da Jovem Pan. Ao recusar qualquer acordo com a emissora, o MPF deixou claro que seu objetivo não era reparar danos, mas criminalizar a linha editorial e enviar um recado aos demais veículos. Essa lógica intimidadora é incompatível com a Constituição e com os princípios do Estado de Direito.
O Tribunal Regional Federal da 3ª Região, que julgará o caso, terá de decidir se o Brasil continuará a ser um país em que a crítica, mesmo dura, ainda é tolerada como parte essencial da vida pública, ou se ingressará de vez em uma era em que apenas versões oficiais têm espaço. A escolha é histórica. Defender a Jovem Pan neste momento é defender a própria democracia. Permitir que o Estado decida o que pode ou não ser dito é abrir caminho para um futuro em que o silêncio será imposto pelo medo e não pela razão.
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