STF quer derrubar regra anti-Mendonça e Kassio para liberar votos de Dino e Zanin
(FOLHAPRESS) - O STF (Supremo Tribunal Federal) pode rever uma regra, definida há dois anos, para manter a validade de votos deixados por ministros aposentados. Isso pode beneficiar, caso a ideia prospere, Cristiano Zanin e Flávio Dino -ambos indicados pelo presidente Lula (PT).
Hoje, com a regra de 2022, votos manifestados em julgamentos virtuais por magistrados que depois se aposentaram continuam valendo caso haja pedido para que o tema seja apreciado no plenário presencial.
Ao menos dois ministros, Alexandre de Moraes e Luiz Fux, mudaram a visão sobre o tema e defendem agora que tudo comece do zero, o que dá margem para os ministros novatos emplacarem seus entendimentos no lugar dos votos dos aposentados.
Se aprovada, a mudança pode impactar casos como o da descriminalização do aborto, da quebra de sigilo de buscas no Google ou do ISS (Imposto sobre Serviços) na base de cálculo do Pis/Cofins.
De acordo com dois integrantes da corte ouvidos pela reportagem, a ideia preocupa tanto pelo risco de insegurança jurídica quanto pelo casuísmo.
Foi o próprio Moraes quem propôs a regra em junho de 2022, durante o governo Jair Bolsonaro (PL). André Mendonça e Kassio Nunes Marques foram os mais atingidos na ocasião.
Eles foram indicados em 2020 e 2021 pelo ex-presidente, que alimentava tensões com ataques à corte. Os dois foram recebidos com resistência pelo colegiado.
Em 2022, a corte discutia a revisão da vida toda sobre cálculos previdenciários, um caso bastante aguardado no ano. Pautado no plenário virtual, o tema somou 11 votos com maioria à tese que beneficiava aposentados e pensionistas, na linha aberta pelo relator Marco Aurélio Mello (que se aposentou em 2021) e Moraes.
Kassio Nunes Marques foi pró-INSS, e pediu destaque (para levar o caso ao plenário físico), a minutos do encerramento do julgamento no sistema eletrônico. O movimento gerou críticas.
Moraes argumentou que validar os votos dos aposentados estaria de acordo tanto com o regimento interno quanto com a legislação. "Uma vez dado, deve ser mantido o voto do ministro que já proferiu e que não pode debater e defender o seu voto", disse Moraes.
Ele foi um dos maiores defensores da regra em 2022, aprovada quase por unanimidade.
André Mendonça foi o único contrário à ideia na época. Afirmou que violaria a ampla defesa porque, em novo julgamento, as partes não teriam chance de convencer ministros que já não faziam parte da corte.
Kassio Nunes Marques acompanhou a maioria, mas antes manifestou preocupação. Ele listou 25 casos que seriam afetados e indagou se a regra valeria para todas as ações a partir dali.
Não votaram os ministros Gilmar Mendes, ausente, e Dias Toffoli, que estava em videoconferência e ficou sem conexão.
Agora, a ideia da nova mudança foi dada por Fux, depois de consultar Moraes, e endossada por Toffoli. Os ministros dizem que a composição do tribunal mudou e as regras devem acompanhar a renovação. Os indicados por Lula têm bom trânsito na corte e participariam de mais casos com a revisão.
Fora, formalmente, de vários casos, Flávio Dino tem feito comentários e sugestões durante os debates no plenário. Os colegas brincam ser um ministro "com voz, mas sem voto".
O discurso de Moraes sobre o tema, então, mudou. "Tivemos vários casos em que, se todos pudessem ter votado no mérito, não precisaríamos ter mudado o julgamento em análise de embargos. Até para o jurisdicionado fica algo estranho", disse ele em outubro.
Fux falou em "repensar o regimento para permitir que novos votem em questões que ainda não acabaram".
Ainda não há formalização do pedido de alteração à Comissão de Regimento. O grupo é presidido por Fux e tem Moraes e Fachin como integrantes.
Antes de sair do STF, os ministros costumam deixar votos em casos que consideram importantes. A ação da descriminalização do aborto foi a última pautada por Rosa Weber, em 2023. A ministra defendeu a autonomia das mulheres. Flávio Dino, ocupante da cadeira que foi dela, disse, na sabatina no Senado que antecedeu sua posse, que entende que o STF não deveria tratar do tema.
Rosa Weber também se manifestou na discussão sobre a Justiça determinar a entrega de dados de pessoas que procuraram informações em buscadores como o Google para órgãos de investigação. Para ela, o Marco Civil da Internet não admite essa possibilidade. O processo tem repercussão geral, e a tese servirá para todas as ações similares.
Outro caso, com votos de três magistrados já aposentados, é o do ISS na base de cálculo do Pis/Cofins, com previsão de impacto de R$ 35 bilhões em cinco anos à União. Rosa, Ricardo Lewandowski e Celso de Mello foram favoráveis ao contribuinte.
Professor de direito da Uerj (Univers